A vida se renova no Pantanal, mas não se espera uma grande cheia
Depois de quatro anos (2019 a 2022) de seca no Pantanal, com período crítico de queimadas, impactos incalculáveis na fauna e flora e consequências também na qualidade da água dos rios, a intensidade das chuvas neste primeiro semestre do ano na bacia do Rio Paraguai mudou o cenário do bioma, não apenas na vegetação, recuperando-se das cinzas.
A vida se renova na terra e na água e o Pantanal entra em processo (ainda lento) de recuperação.
Com mudanças no comportamento das águas – “neste ano, as bacias hidrográficas do Sul do Pantanal estão recebendo mais chuvas do que as do Norte, o contrário do que normalmente ocorre”, observa o pesquisador Agostinho Catella, da Embrapa Pantanal -, o Rio Paraguai atingiu 5,94 metros em Porto Murtinho, no extremo sudoeste, na primeira semana de março.
Neste mês, entre 2020 e 2022, a média na mesma régua foi inferior a 3,30 metros. Os pantaneiros da planície comemoram a chegada das águas, postando nas redes sociais imagens de suas camionetes cruzando grandes alagados, enquanto o principal rio da bacia continua em elevação nas cabeceiras.
Em Cáceres (MT), superou 4,70 metros, nível inferior apenas a 2018 (4,96m). Essa água chegará em junho a Ladário, cidade vizinha a Corumbá, onde o Paraguai ainda está baixo (2,36m) para a média histórica (em 2018, atingiu 4,10m no período).
Mais água, mais peixe
O ressurgimento das baías e corixos e campos inundados beneficia toda a cadeia alimentar do ecossistema, do homem aos microrganismos.
A fauna, em especial as aves, ressurgiu, para deleite dos turistas e alivio dos ambientalistas, os quais fizeram estimativas subestimadas do desastre causado pelo fogo.
A pesca, em especial, terá um ano de boa produção, embora não comparada às grandes cheias (quando o nível do Rio Paraguai supera os 5m em Ladário).
“As condições ambientais (do Pantanal) em 2023 devem concorrer positivamente para a produção natural de peixes e para a pesca”, segundo Catella, especialista em ictiofauna pantaneira.
O fim da piracema (fevereiro) coincidiu com a subida das águas e favorece a manutenção do estoque pesqueiro. Os peixes grandes e os jovens recém nascidos e os ovos rodam rio abaixo e adentram os campos inundados, onde encontram alimento e abrigo.
“Na vazante, com o refluxo das águas, os adultos retornam para os rios e reiniciam um novo ciclo. Muitos peixes de espécies pequenas, que não fazem piracema, permanecem nos alagados durante a estiagem. A grande quantidade de peixes retidas nesses ambientes alimenta as aves que se reproduzem durante a vazante no Pantanal”, explica Catella. “Além de sua função ecológica, os peixes são de grande importância social e econômica para a pesca.”
Embora os anos de pandemia do coronavírus e de seca tenham sido críticos para o setor turístico pesqueiro, a diminuição da atividade, tanto amadora como profissional, foi positiva para a ictiofauna, que já se encontrava sob o estresse de anos de pouca chuva na região, avalia o pesquisador da Embrapa.
Com a abundância de água, segundo ele, “os peixes conseguem manter grandes populações, o que garante a piscosidade dos rios do Pantanal”.
CORREIO DO ESTADO
segunda-feira, 27 de março de 2023